22 de julho de 2017

VIDA CONSAGRADA: TEMPOS NOVOS, MUDANÇAS NOVAS




A Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica publicou a 6 de Janeiro de 2017 umas orientações intituladas Vinho novo, odres novos – A vida consagrada desde o Concílio Vaticano II e os desafios ainda em aberto.

O documento é um exercício de discernimento prático para «ler práticas inadequadas, indicar processos bloqueados, fazer perguntas concretas, pedir razões das estruturas de relação, de governo e de formação sobre o apoio real dado à forma de vida evangélica das pessoas consagradas» como explica o penúltimo parágrafo da curta introdução.

Esta inovação tem a ver com a atualização histórica dos carismas face às realidades socioculturais que vivemos (as novas pobrezas) e a linguagem (simbolismo) para os comunicarmos às novas gerações.

A evolução social, económica, política, científica e tecnológica a par com a intervenção estatal em nichos tradicionalmente ocupados pelos consagrados transformaram-nos em presença redundante. Por outro lado, emergências novas e inéditas pedem exigências que continuam à espera de resposta por parte da vida consagrada.

Os religiosos estão superados? Somos fósseis vivos, dinossauros cristãos em vias de extinção? «As novas pobrezas interpelam a consciência de muitos consagrados e solicitam aos carismas históricos novas formas de resposta generosa frente às novas situações e aos novos descartes da história. Daí o florescimento das novas formas de presença e de serviço nas múltiplas periferias existenciais» (nº 7).

Há novas alianças com os leigos a par de uma mudança de registo imprescindível: passar da gestão das crises e da sobrevivência à imaginação criativa de novos percursos de vida e consagração (n.º 8).



1. DESAFIOS EM ABERTO

O desafio maior é a inovação: «o velho esquema institucional tem dificuldade em dar passagem a novos modelos de modo decidido» (nº 9).

Há três questões em aberto: «harmonia e coexistência» entre a tradição e as inovações pedidas pelo Concílio; avaliação do funcionamento dos «elementos de mediação» face às novidades; ver o que «bebemos»: vinho novo ou a martelo para «esconder» erros/problemas não resolvidos.

Nalgumas realidades da vida consagrada as pessoas sentem-se incapazes de acolher os sinais daquilo que é novo. Por isso, «não podemos continuar a protelar o dever de entendermos juntos onde se encontra o nó a desatar, para sairmos da paralisia e superarmos o medo frente ao futuro» (nº 10). Um trabalho em conjunto, portanto! «Estamos juntos!» como dizem os moçambicanos.



2. FORMAÇÃO


A debandada que afeta a vida religiosa não vem «sempre e apenas» das crises afectivas mas «muitas vezes essas crises afectivas são fruto de uma remota desilusão por uma vida de comunidade sem autenticidade» (nº 13); crise de fé e excesso de atividades bem como o isolamento dos jovens em comunidades maioritariamente de pessoas idosas provocando um fosso de gerações no que se refere à espiritualidade, oração e pastoral.

O nº 24 é bem mais contundente: «dentre os motivos principais dos abandonos, destacam-se […] o debilitamento da visão de fé, os conflitos na vida fraterna e a vida fraterna débil em termos de humanidade».

O caminho? Recriar a linguagem simbólica da vida religiosa tendo em conta a diversificação cultural que transforma os institutos a partir de dentro.

«O cuidado em vista a um crescimento harmonioso entre a dimensão espiritual e a dimensão humana implica uma atenção específica à antropologia das diversas culturas e à sensibilidade própria das novas gerações, com particular referência aos novos contextos de vida. Só um reentendimento profundo do simbolismo que toca verdadeiramente o coração das novas gerações pode evitar o perigo de se contentarem com uma adesão apenas superficial, de tendência e até de moda, onde parece que a busca de sinais exteriores transmite segurança de identidade», lê-se no nº 14.

Combinar essa recriação do simbolismo com os ideais de beleza e conforto das gerações de hoje é um desafio enorme.

As orientações exigem respostas concretas de todos os institutos desde a formação (novos formadores-peregrinos abertos a novos percursos de formação sinodal e personalizada usando o modelo iniciático e a comunidade formativa) à necessidade urgente de uma cultura de formação permanente ou contínua e iniciação séria ao governo (nº 16). Com exigências destas não admira que haja tão poucos candidatos a formadores!

Para amadurecer a reciprocidade entre homens e mulheres na vida consagrada, o documento pede «promover relações de irmandade entre consagradas e consagrados dentro da Igreja» (nº 18). Obejtivo? «Para se tornarem um modelo de sustentabilidade antropológica) (nº 18).

Não podemos continuar a viver de costas voltadas, mulheres e homens da vida consagrada.



3. AUTORIDADE

O documento faz uma reflexão profunda sobre a crise de autoridade que afeta a vida religiosa. Propõe a passagem do autoritarismo à subsidiariedade e à delegação para garantir as autonomias de cada nível de autoridade (geral, provincial e comunidades). O serviço da autoridade deve partir de uma espiritualidade de comunhão participativa (nº 21) autonomizando as pessoas para gerirem o dia-a-dia em normalidade (nº 21) em vez de criar dependências infantis sem espaço para a originalidade.

O documento critica a clericalização da vida consagrada e nota que os empenhos pastorais podem debilitar a vida comunitária dos membros-padres.

«A terminologia “superiores” e “súbditos” já não é adequada», sublinha o nº 24, propondo o fim das pirâmides da autoridade.

Interessante também a perspectiva de preparar as novas gerações para o governo dos institutos durante o período de formação de base.



4. ADMINISTRAÇÃO DE BENS

O documento faz uma reflexão robusta sobre o tema da administração dos bens e relaciona-o com o profetismo da vida fraterna: «A vida consagrada tem sido capaz de se opor profeticamente, cada vez que o poder económico correu o risco de humilhar as pessoas. Na atual situação global de crise financeira […] os consagrados são chamados a ser verdadeiramente fiéis e criativos para não faltarem à profecia da vida comum internamente e da solidariedade para com o exterior sobretudo em relação aos mais pobres e mais frágeis» (nº 26) através da transparência económica e financeira e da distribuição de bens.

Um sublinhado a reter: «Os bens dos institutos são bens eclesiais e participam das mesmas finalidades no modo evangélico da promoção da pessoa humana, da missão e da partilha caritativa e solidária com o povo de Deus» (nº 28).»



5. INOVAR É PRECISO

As Orientações propõem caminhos concretos, um GPS para a recriação da vida consagrada:

  • Aprender «um processo de abertura infinita à novidade do Reino» (nº 29);
  • Abrir caminhos novos de esperança, «descobrir novos percursos rumo à autenticidade do testemunho evangélico e carismático da vida consagrada» (nº 30);
  • Assumir atitudes e escolhas novas que sublinhem o primado do serviço e a solidariedade como os mais pobres (nº 31);
  • Ultrapassar o fosso geracional através da inculturação, multiculturalidade e interculturalidade e da modificação de estruturas (nº 33);
  • Passar dos seminários/noviciados trentinos para novas formas e estruturas que sustentem os consagrados (nº 35);
  • Exercer autoridade de proximidade (nº 36);
  • Preparar formadores que aceitem a multiculturalidade como forma de viver a fé (nº 37) e as suas consequências e exigências (nº 38) através de novos estilos, estruturas (nº 39) e processos de internacionalização (nº 40);
  • Recentrar o serviço da autoridade na dinâmica da fraternidade ao serviço da comunhão (nº 41), de projetos comuns (nº 42) e «novos equilíbrios culturais na vida e no governo dos institutos» (nº 53).

6. MISSÃO IMPOSSÍVEL

Partilhei esta reflexão com o conselho provincial e os membros de uma comunidade em Portugal. Um dos missionários comentou que o documento é muito belo, mas «é uma missão impossível».

Eu acredito que Vinho novo, odres novos tem em si todos os ingredientes necessários para renovar a vida consagrada. Mas necessita de um envolvimento emocional por parte das religiosas e religiosos. Se começamos a construir obstáculos do género «Missão impossível» então é mais um documento para ser votado ao pó das prateleiras.

18 de julho de 2017

QUATRO PALAVRAS PARA UM JUBILEU


Os participantes no simpósio sobre os 150 anos do Instituto enviaram-nos quatro palavras que sustêm o altar da memória sobre o qual colocamos o nosso futuro como oferenda sagrada ao Senhor da missão: mística, humildade, fraternidade e ministerialidade.

Mística: o grande teólogo Karl Rahner escreveu que «o Cristão do século xxi ou será místico ou não será cristão» e acrescentou «desde que não se entendam por mística fenómenos parapsicológicos raros, mas uma experiência de Deus autêntica, que brota do interior da existência». A oração e a espiritualidade contemplativas são a fonte da vida fraterna e do serviço missionário, de cenáculos de apóstolos. A mística, segundo a mensagem que os participantes no simpósio escreveram a todos os missionários, também ajuda a aprender a fé e a esperança com os pobres com quem fazemos causa comum.

Humildade: como Instituto estamos mais pequenos e frágeis e somos chamados a passar do protagonismo ao testemunho como modo de vida missionária. Mais do que fazer missão, somos desafiados a ser missão, a partilhar o tesouro que enche o nosso coração.

Fraternidade
: para sermos missionários melhores temos que nos amar mais uns aos outros, melhorar as relações humanas dentro das comunidades combonianas, torná-las verdadeiros cenáculos de apóstolos. O nosso sistema formativo está muito desequilibrado: prepara missionários com uma grande cabeça – ricos em intelectualidade – e com um coração atrofiado – pobres em humanidade. Depois o projeto comum não devia ser a soma dos projetos pessoais, mas um projeto de vida e de missão para todos. É imperioso partilhar mais as nossas experiências pessoais de Deus – a autoridade de Jesus vinha disso mesmo: ele não ensinava teologia, partilhava a experiência do Abba (Papá) das longas noites de contemplação em lugares ermos. É fácil falar sobre desporto, política, sobre os outros … e torna-se tão difícil expressar o Deus que habita no mais profundo de nós mesmos! A vida comunitária não deve ser vista como funcional (trabalhamos melhor juntos) nem como segurança (cama, mesa e roupa lavada para os «consumidores de comunidade»). A forma como vivemos é a primeiro Evangelho que anunciamos. Somos presente de Deus uns para os outros, não somos estranhos nem pesos a suportar.

Ministerialidade: a quebra nos números e na energia missionária do Instituto e da Província leva a uma inevitável redução de compromissos. Fechar Calvão – uma experiência compreensivelmente dolorosa para alguns e um sinal lindo da relação esponsal que mantêm com as pessoas com quem vivem o discipulado – é o primeiro passo nessa revisão, mas não deve ser o único. Os participantes propõem a qualificação em certos campos de evangelização, porque – ao contrário do que diz a sabedoria popular milenar – não somos pau para toda a colher. A chave está no trabalho em rede, em novas alianças ministeriais (como no-lo recordam os Documentos Capitulares 2015): com a família comboniana, com a Igreja local e com outros parceiros estratégicos da sociedade civil. E o fazer da missão o motor de continuidade do nosso processo formativo permanente para fortalecer a paixão por Cristo e pela humanidade.

Estas são as quatro palavras-chave que nos abrem à vida comboniana em plenitude.

Mística, humildade, fraternidade, ministerialidade: quatro palavras mágicas que desvendam o segredo da felicidade comunitária e pessoal. Estas quatro palavras vão fazer o conteúdo da assembleia provincial juntamente com as lições da nossa história em Portugal sob o tema genérico Coração missionário jubilar.

16 de julho de 2017

COMBONIANO NOMEADO BISPO AUXILIAR NA ÁFRICA CENTRAL

Um missionário comboniano espanhol foi nomeado bispo auxiliar da diocese de Bangassou, na República Centro-Africana.

O Vaticano anunciou na terça-feira, 11 de julho, que o Santo Padre nomeou o padre Jesús Ruiz Molina bispo auxiliar de Bangassou.

O P. Jesús tem 58 anos e era até agora pároco de Moumgoumba e coordenador diocesano da pastoral de catequese na diocese centro-africana de M’Baiki.

Nasceu em La Cueva de Roa, Burgos e foi ordenado em 1987.

Trabalhou em Espanha (animação missionária, formação e Leigos Missionários Combonianos-LMC), Chade (pároco e provincial) e República Centro-Africana (pároco, coordenador de pastoral e conselheiro provincial).

A teóloga Susana Vilas Boas, leiga missionária comboniana que trabalhou largos anos com o P. Jesús na comunidade internacional LMC de Moungoumba, descreve o novo prelado como «alguém que dá cor à missão e cuja criatividade não se esgota quando se trata do anúncio do Evangelho».

O P. Jesús é bispo titular da diocese de Are da Mauritânia que, entretanto, deixou de existir.

Vai ser bispo auxiliar de Dom Juan José Aguirre, que também é comboniano e espanhol e tem feito um trabalho notável de reconciliação e paz entre muçulmanos e outros grupos na sua diocese.


15 de julho de 2017

Obituário: P. ROGÉRIO ARTUR DE SOUSA


29-4-1933 | 24-6-2017

Era visível que o P. Rogério Artur de Sousa se estava a apagar como uma lamparina a consumir as últimas gotas de azeite. Andava mais calado, gostava de se sentar no presbitério junto ao Santíssimo Sacramento em silêncio enquanto a comunidade rezava as laudes com as combonianas e alguns leigos. Deixou de usar a prótese dentária. Mas mantinha o sentido de humor: da última vez que estive com ele, bateu-me com a inseparável bengala na cabeça com carinho e disse: «Ó provincial, continuas a crescer!»

Entretanto, é internado a 15 de junho no Hospital São Teotónio de Viseu com um quadro de insuficiência cardíaca e tem alta uma semana depois. No dia 24 de junho sente dificuldades para jantar e por volta das 20h00 retira-se para o quarto. Dada a respiração difícil e laboriosa é chamada a emergência médica que se limita a confirmar a morte. O P. Rogério entra no Céu no dia em que a Igreja celebra o nascimento de São João Batista. O decano dos padres combonianos portugueses conta 84 anos de idade.

O P. Rogério nasce a 29 de abril de 1933 no lugar de Sargaçais, paróquia de Souto de Aguiar, concelho de Aguiar da Beira do casal de agricultores António Augusto de Sousa e Rosa de Jesus.

Dos oito filhos do casal (duas mulheres e seis homens) cinco enveredaram pela vida religiosa: uma moça entra nas Irmãs Doroteias e quatro moços nos combonianos: dois padres (P. Rogério e P. José de Sousa) e dois irmãos (o Ir. Miguel dos Santos que falece em 1979 em Coimbra e o Ir. Jorge Fernandes de Sousa que, entretanto, deixa o Instituto no Brasil).

O P. Rogério entra para os combonianos do Seminário Maior de Viseu em 1951. Faz o noviciado em Gozzano (Itália) e os primeiros votos a 9 de setembro de 1954 em Viseu juntamente com o Ir. António Martins da Costa – os primeiros dois portugueses a professar no Instituto sete anos depois de os combonianos terem chegado a Viseu.

Cursa teologia em Venegono (Itália) entre 1954 e 1957 e em Viseu no ano de 1957-1958. Faz a profissão perpétua em 10 de março de 1958 e é ordenado a 27 de julho em Viseu onde permanece como professor até 1960.

Nesse ano parte para Moçambique para a missão de Lunga. Regressa a Portugal em 1962 e integra a equipa que produz a revista Além-Mar em Paço d’Arcos. Dois anos depois, vai para VN de Famalicão como formador do seminário menor.

Em 1967 retorna a Moçambique como capelão militar. Três anos depois volta ao serviço missionário ativo em várias missões da diocese de Nampula: Carapira (1970-1971), Nacala (1971-1974), Mossuril (1974-1976) e Memba (1976-1987).

O P. Rogério faz parte do grupo de 11 combonianos expulsos de Moçambique a 13 de abril de 1974 em retaliação pelo Um Imperativo de Consciência escrito pelo Bispo Manuel Vieira Pinto e pelos combonianos.

Volta a Moçambique logo que a situação política o permite. Nos primeiros anos da independência os tempos são difíceis. Escreve a 5 de dezembro de 1981 de Namahaca: «Por aqui vai-se vivendo e até finalmente depois da conclusão das aulas a 25/11 se vai respirando um pouco de alívio. Não haja dúvidas que de 3/9 até fins de novembro foi preciso trabalhar como um moiro. Na diocese, vamos tendo quase por toda a parte possibilidade de contactar com os crentes. Há 15 dias também no Monapo se abriram as portas. Aguardamos ainda quanto a Mussoril, Lunga e Mueria.»

Em 1987, regressa a Portugal e fica em Lisboa até 1993 como membro da redação das revistas. Além de escrever (assina os artigos com o seu nome e também usa pseudónimo), traduz muito material do italiano para português.

Em 1993, o Conselho Geral destinou-o ao Brasil, mas nunca chega a partir porque «a Vinda Intermédia de Jesus – que ainda não é a derradeira – está para breve.»

Passa dois anos fora de comunidade, é reintegrado em Lisboa, transferido para VN Famalicão para o serviço de confissões e em 2013 vem para Viseu para o Centro de Acolhimento da Província.

O P. Rogério é um missionário humilde e zeloso com uma grande devoção à Divina Misericórdia. Tenta dar corpo a um movimento laical – Missionários da Divina Misericórdia – inspirado nos escritos e visões de Santa Faustina, fruto de uma inquietação antiga: «Já há muitos anos venho sentindo uma necessidade grande de divulgar e manifestar sobremaneira a Misericórdia de Deus, para que nestes tempos que também são de confusão e afastamento de Deus, os homens e o mundo reencontrem com alegria “as fontes da Salvação” para as quais o Coração Trespassado de Jesus não deixa de apontar.» Um projeto que lhe acarreta inúmeras dificuldades com o Instituto.

O P. Rogério também faz parte do Renovamento Carismático e propõe aos superiores investigar o tema Comboni e o Divino Espírito Santo e escrever um livro sobre o tema.

Para o P. José de Sousa, o seu irmão «foi sempre em tudo como Missionário Comboniano. A experiência que ele fez de estar fora da comunidade em Lisboa trouxe-lhe muito entusiasmo na fé e muito sofrimento. Rogério levou sempre a vida e o sim a Comboni muito a sério. Como difusor com livros próprios da Divina Misericórdia sofreu críticas exageradas, injustas acerca desse assunto que foi plenamente assumido por São João Paulo II e a festa/domingo da Divina Misericórdia. Uniu-se à Cruz com uma entrega total nas mãos de Deus esquecendo tudo o que o fez sofrer. A devoção ao santo Padre Pio o confortou e conformou.»

O P. Claudino Ferreira Gomes descreve bem o P. Rogério: «Seja o Senhor louvado pelo seu servo e amigo, que tanto esperava a vinda de Jesus. Será feliz quando o Senhor em Pessoa lhe explicar esse mistério. Entretanto, eu agradeço a Deus pela dedicação missionária e pastoral e pelo espírito contemplativo do P. Rogério. E por todas as vezes que me atendeu de confissão até há pouco tempo, aconselhando sempre com zelo e sabedoria.»

O advogado Dr. Aurélio Pinto, antigo aluno comboniano recorda o P. Rogério sobretudo como pedagogo: «Não posso deixar de manifestar a tão grata memória do saudoso Padre Rogério, pela relevância que teve na minha formação e educação religiosa e humana, de que me apraz destacar o seu sentido de prática de justiça e rigor, moldados pelo amor cristão que certamente orientavam a sua vida.»

É este missionário que agradecemos, celebramos e entregamos ao Senhor das misericórdias.

P. José Vieira

6 de julho de 2017

P. ROGÉRIO DE SOUSA: TRIBUTOS


O P. Rogério Artur de Sousa partiu para o Pai a 24 de junho de 2017. O decano dos padres combonianos portugueses tinha 84 anos. Eis alguns dos tributos que lhe foram prestados:

O meu irmão foi sempre em tudo como Missionário Comboniano. A experiência que ele fez de estar fora da comunidade em Lisboa trouxe-lhe muito entusiasmo na fé e muito sofrimento. Rogério levou sempre a vida e o sim a Comboni muito a sério. Como difusor com livros próprios da Divina Misericórdia sofreu críticas exageradas, injustas acerca desse assunto que foi plenamente assumido por São João Paulo II e a festa/domingo da Divina Misericórdia. Uniu-se à Cruz com uma entrega total nas mãos de Deus esquecendo tudo o que o fez sofrer. A devoção ao santo Padre Pio o confortou e conformou.
P. José de Sousa (Viseu)

Vimos comunicar-vos que o Pe. Artur de Sousa, missionário comboniano, que pertencia à comunidade de Viseu, faleceu no dia 24 de junho, por volta das 21.30, de insuficiência cardíaca.

Muitos se lembrarão do sorriso bonito do Pe. Rogério pelos espaços da casa de Viseu!

Somos felizes por tê-lo conhecido.

Em comunhão no Coração de Jesus,
Ir Mª do Carmo Ribeiro (LMC Portugal)


Paz à sua alma

Unidos na oração à família de sangue e à família comboniana.
P. António Carlos (Filipinas)


Uno-me a todos os combonianos de Portugal nesta ocasião da passagem para o Pai do nosso irmão P. Rogério Artur de Sousa.

Deus o receba na sua casa, tendo em conta a sua dedicação à missão e ao anúncio da alegria do Evangelho.

Consola-nos o facto que no dia de ontem, em Nampula, professaram os primeiros noviços do novo Noviciado. Eles irão ocupar o lugar dos que vão falecendo. Deus continua presente na sua Igreja e chama novos jovens a quem confiar o anúncio da Boa Nova.

Deus dê descanso à alma do P. Rogério e console os seus familiares, especialmente ao seu irmão P. Zé e à Irmã Maria do Carmo e a todos os amigos e conhecidos.
P. Luís Albuquerque (Maputo – Moçambique)


Deus envolva o P. Rogério na sua misericórdia. Era zeloso, à sua maneira, das coisas de Deus. Certamente está já nas mãos dele.

Estou unido à província e a toda a sua família.
P. Júlio (Nampula – Moçambique)


O saudoso padre Rogério foi hoje lembrado e elogiado no Encontro de Espiritualidade Comboniana, na Maia. Rezámos por ele na oração e na Eucaristia.

Também pelas duas irmãs que faleceram em acidente na Amazónia; muito senti a sua perda, mesmo não as conhecendo.

Que todos permaneçam como tochas acesas no nosso caminho missionário, intercedendo junto do Pai.
Mário Breda (LMC-Portugal) 


No dia em que celebramos na República Democrática do Congo a Festa do Coração de Jesus, quero unir-me a toda a província de Portugal na oração pelo eterno repouso do P. Rogério. Que o Senhor o acolha na sua misericórdia.
Zé Arieira (RD Congo)


Choque grande ao receber a notícia.
A ti, cabeça da Província, apresento os meus pêsames, em comunhão com todos os nossos irmãos missionários combonianos.Seja o Senhor louvado pelo seu servo e amigo, que tanto esperava a vinda de Jesus. Será feliz quando o Senhor em Pessoa lhe explicar esse mistério.

Entretanto, eu agradeço a Deus pela dedicação missionária e pastoral e pelo espírito contemplativo do P. Rogério. E por todas as vezes que me atendeu de confissão até há pouco tempo, aconselhando sempre com zelo e sabedoria.
P. Claudino (Lisboa)


Que o Rogério descanse na paz de Deus. Recordo os anos que vivi com ele em Famalicão. Rezo por ele e pela sua família.
Dave (Filipinas)


As minhas condolências ao Pe. Zé e família.
P. J. Juan Valero (Uganda)


Uno-me a ti e à província neste momento de adeus ao Rogério. Rezo pelo Rogério e pela família.
José Eduardo Freitas (Matany-Uganda)


Em comunhão com toda a província,
Manuel João (Castel d’Azzano – Itália)


Muito obrigado pela informação sobre o falecimento do nosso P. Rogério. Estarei unido a ti, que representas toda a nossa família Comboniana, ao P. José de Sousa e toda a sua família, nestes dias de mágoa, mas também de esperança e de fé.
P. Francisco Machado (Gana)


Estou unido ao luto e à esperança cristã, por ocasião do falecimento do Padre Rogério de Sousa.

Particulares sentimentos ao Padre José de Sousa e outros familiares, e aos colegas da comunidade de Viseu.

Que descanse em paz, e interceda por nós todos, e por Moçambique em particular por que muito sofreu.
Manuel dos Anjos (Tete – Moçambique)


Nós missionários do “mato” temos estado fora do resto do mundo, sem net há tanto tempo!

Nestes dias estou em Adis Abeba e por isso tive possibilidade de abrir a net, depois de umas semanas, e encontrei as várias mensagens tuas, especialmente sobre a morte da Conceição Primitivo e do nosso grande padre Rogério! Solidariedade com estas perdas para a nossa província e uma oração pelo seu eterno repouso!

A vida por aqui continua, sempre animados com a missão e sempre a rodar!

Graças a Deus por estes anos e pelos nossos irmãos maiores que tanto me ensinaram sobre a felicidade na vida dedicada a Deus e à Missão! As maiores felicidades para a província!
Quim (Etiópia)

Tendo, somente agora, por consulta ao V/ boletim informativo de 29/06/2017, tomado conhecimento do falecimento do S/ confrade P.e Rogério de Sousa, não posso deixar de manifestar-lhe, a si e a todos os confrades combonianos e grandes amigos, a tão grata memória do saudoso Padre Rogério, pela relevância que teve na minha formação e educação religiosa e humana, de que me apraz destacar o seu sentido de prática de justiça e rigor, moldados pelo amor cristão que certamente orientavam a sua vida.
Aurélio Pinto

4 de julho de 2017

SAFARIS DE LETRAS


Os registos escritos das viagens africanas fascinam.
Heródoto visitou a Líbia e o Egipto há 2450 anos. As impressões que este grego, chamado Pai da História, escreveu fizeram escola atraindo gerações para um continente que se instalou definitivamente no imaginário dos Europeus, e, por via destes, do mundo. Ler quem depois dele se fez aos bosques e sertões de África para no-la dar a conhecer é outra forma de viajar – e de compreender o berço da humanidade.

O meu conterrâneo Alexandre de Serpa Pinto (1846-1900) levou-me de Benguela, na costa angolana do Atlântico, a Durban, cidade sul-africana debruçada sobre o Índico, com a cabrinha Córa e o papagaio Calungo por entre maravilhas e perigos. Abriu caminho pelo interior desconhecido com aguardente, panos e outras bugigangas, numa odisseia de 17 meses a pé, de cavalo, padiola, piroga e carroça.

Como eu Atravessei a África do Atlântico ao Índico relata essa viagem épica e científica extremamente perigosa de Angola até à África do Sul passando pela Zâmbia e o Zimbabué entre 12 de Novembro de 1877 e 19 de Março de 1879. Ilustrou-a com alguns desenhos a traço. Contém muitas notas geográficas e etnográficas e inúmeros registos científicos e medições que o explorador cinfanense fez. Tudo num português com mais de 100 anos: como a língua evoluiu à margem dos acordos ortográficos!

Serpa Pinto baloiçou perigosamente sobre as Cataratas Vitória para determinar a sua altura e posição. Mozia-oa-tunia, o nome da extraordinária cortina de água na língua local, é nas suas palavras «a mais prodigiosa maravilha do continente africano», «uma soberba maravilha que gera sentimentos de terror e tristeza».

Paul Theroux levou-me do Cairo, no Egipto, ao Cabo, na África do Sul, por terra e por água, excepto para entrar e sair do Sudão – teve de tomar o avião. Viagem por África é um diário que anota impressões profundas de lugares e de pessoas. Fala de Comboni, dos missionários, incluindo um comboniano que encontrou no Egipto, censura evangélicos e ONG, apresenta um registo reflexivo sobre o que vê e ouve. «A minha viagem foi uma delícia e uma revelação», escreve logo na segunda página.

Viajei com Gonçalo Cadilhe da Ponta das Agulhas, na África do Sul, até Tânger, em Marrocos. África acima vem num registo muito auto-referencial. O autor viaja por terra e por água usando transportes públicos e boleias. «Abriu» um posto de controlo com comprimidos de alho que ofereceu às autoridades por afrodisíacos.

Outro registo interessante é o diário que o padre Francisco Álvares escreveu da viagem da embaixada portuguesa à Etiópia entre 1520 e 1526 da qual era capelão. Verdadera Informaçam das terras do Preste Joam das Indias, publicado em 1540, é o primeiro livro de viagens sobre a Etiópia. Li-o quando vivia no país – a páginas tantas fiquei com a impressão que uma parte da Etiópia estava parada no tempo. Descreve a corte ambulante do rei Lebna Dengel no seu esplendor, o quotidiano e a fé dos Abissínios, com alguns mal-entendidos à mistura.

De onde vem esta atracção pela África, pelas viagens e pelos seus diários? Gonçalo Cadilhe, escritor-viajante, explica: «Tal como a vida, que não se repete quando termina, também cada dia em África pede para ser absorvido como se não houvesse outros. Sei porque me sinto tão sensível, tão vivo: porque este continente restitui ao europeu a sua fragilidade de grão de areia perdido no deserto da eternidade. É uma descoberta. Uma vertigem.»