5 de outubro de 2015

FAMÍLIA A DUAS VOZES


A Igreja africana pode falar a duas vozes no sínodo sobre a família na linha de dois encontros eclesiais importantes deste Verão.

A comunidade católica celebra de 4 a 25 de Outubro no Vaticano a segunda parte do sínodo sobre a vocação da família na Igreja e no mundo contemporâneo. Qual vai ser a contribuição da África? Mais doutrinal para uns, mais pastoral para outros.

Cinco cardeais e 45 bispos encontraram-se em Acra, Gana, de 8 a 11 de Junho, numa consulta organizada pelo Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagáscar, para alinharem posições para o sínodo.

O cardeal guineense Robert Sarah, prefeito da congregação vaticana do Culto Divino, encorajou os participantes «a falarem com clareza, com uma única voz credível e com amor filial à Igreja» durante os trabalhos sinodais.

«Protegei a santidade do matrimónio que está sob ataque por todas as formas de ideologias que querem destruir a família e também das políticas nacionais e internacionais que impedem a promoção de valores positivos», exortou.

Numa entrevista à revista francesa Famille Chrétienne, foi mais incisivo: «Porque é que devemos pensar que somente a visão ocidental do homem, do mundo e da sociedade é boa, justa e universal? A Igreja deve lutar para dizer não a esta nova colonização.»

Os bispos da Nigéria, numa nota recente, expressaram preocupação sobre a propagação global, persistente e contínua «do estilo de vida homossexual» e denunciaram o esforço para redefinir o matrimónio como «uma visão distorcida da sexualidade humana vinda especialmente do mundo ocidental».

«O casamento é uma união sagrada de um homem e de uma mulher para gerar e criar crianças», escreveram.

Os apelos que saíram do terceiro colóquio teológico anual sobre Igreja, religião e sociedade na África vão noutro sentido. Cerca de quatro dezenas de teólogos católicos, incluindo bispos, reuniram-se em Nairobi, Quénia, de 16 a 18 de Julho, e o sínodo também esteve presente.

Os especialistas criticaram a primeira sessão do sínodo, em Outubro do ano passado, considerando-a demasiado eurocêntrica sobre os temas do divórcio, recasamento e relações do mesmo sexo, que preocupam sobretudo europeus e norte-americanos. Pediram soluções pastorais concretas a nível local em vez de respostas «tamanho único» universais e notaram que a sida, a mutilação genital feminina e as crianças chefes de família são temas que afectam as famílias africanas que ficaram de fora dos debates sinodais.

Disseram que é mais importante tratar dos conflitos dos africanos que se sentem apartados das culturas tradicionais depois da conversão ao Cristianismo, da violência doméstica contra as mulheres e meninas, da ausência do pai na vida familiar, da pobreza vasta e paralisante e da falta de «liderança ética de princípios» nos governos e na Igreja.

O bispo Emanuel Barbara, de Malindi, Quénia, pediu mesmo uma teologia do matrimónio a partir do contexto africano: «Se queremos respeitar as nossas famílias cristãs africanas, temos de trabalhar seriamente numa teologia cristã africana do matrimónio. Não basta aplicar outros modelos que existem há séculos.»

A teóloga queniana Philomena Mwaura indicou a violência contra as mulheres e a ausência de pais estáveis nos países africanos como dois elementos que merecem uma reflexão do sínodo.

O bispo Kevin Dowling, de Rustenburg, África do Sul, advogou que o sínodo devia gastar mais tempo com «os assuntos sistémicos que ameaçam as relações entre pessoas nas sociedades e que tanto dificultam os pais de hoje em alimentar a relação com os seus filhos e criá-los de modos saudáveis que dão vida».

Talvez o ponto de encontro esteja no pedido de Francisco aos bispos do Togo, durante a visita que lhe fizeram em Maio: que preservem os «aspectos positivos» da vida da família em África e que os partilhem, sobretudo a abertura à vida e o respeito no cuidado dos mais velhos.

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