3 de março de 2015

PENÁLTI


A África viveu exuberante mais uma festa do futebol que a Costa do Marfim ganhou ao Gana nas grandes penalidades. A luta pela taça deixou no entanto à vista as dificuldades estruturais do futebol africano. 


Dezasseis selecções do Noroeste, Centro e Sul do continente disputaram a 30.ª Taça das Nações Africanas (CAN), jogada na Guiné Equatorial de 17 de Janeiro a 8 de Fevereiro. Depois de 32 jogos com muitas incidências e emoções, os Elefantes da Costa do Marfim (na foto) derrotaram os Estrelas Negras do Gana por 9-8, em 22 penáltis. Boubacar Barry, o guarda-redes marfinense, foi o herói da final: defendeu um penálti e bateu o remate vencedor. A República Democrática do Congo ficou em terceiro lugar e a selecção anfitriã em quarto.

Marrocos tinha ganhado o direito de organizar a taça africana, mas pediu um adiamento por causa da epidemia de ébola que continua a matar na África Ocidental. A CAF, Confederação Africana de Futebol, não aceitou e entregou a organização da CAN à Guiné Equatorial, que a preparou num tempo recorde de menos de dois meses. Uma equipa de médicos cubanos encarregou-se de fazer a triagem aos atletas e espectadores para despistar casos de ébola.

Os bilhetes para os jogos custavam entre um e 20 dólares, de 88 cêntimos a 17 euros e meio. O presidente da Guiné Equatorial, Teodor Obiang Nguema Mbasogo, comprou 40 mil bilhetes por 30 mil euros para oferecer e «dar carácter solene» ao evento. E propôs que os ricos do país fizessem o mesmo. O seu regime é dos mais corruptos e ditatoriais do continente.

Os quatro estádios onde se disputaram as 32 partidas da CAN tinham uma lotação conjunta de 60 400 espectadores, 5000 a menos que o Estádio da Luz.

Dos 368 jogadores inscritos na competição só 26 tinham mais de 30 anos. Estrelas como Didier Drogba e Samuel Etoo ficaram de fora, como de fora ficaram dois pesos-pesados do futebol africano: Egipto e Nigéria, que não se qualificaram. Metade dos atletas que jogaram na CAN milita em campeonatos europeus, incluindo 75 na França, 26 na Espanha, 21 na Bélgica e na Inglaterra e 15 em Portugal. Havia também dois treinadores portugueses na CAN.

A CAF teve mão pesada na taça. Marrocos vai pagar 880 mil euros de multa e 8 milhões de indemnização e fica fora das edições de 2017 e 2019 por recusar organizar o certame. O país anfitrião tem de desembolsar 88 mil euros porque os adeptos interromperam o jogo das meias-finais durante 40 minutos quando a Guiné Equatorial perdia por três a zero contra o Gana. A Tunísia pode ficar fora da taça de 2017 se não pedir desculpas pelos comentários contra a arbitragem depois do jogo dos quartos-de-final com a Guiné Equatorial. Os anfitriões empataram o jogo no minuto 90 com um penálti duvidoso. O árbitro foi suspenso por seis meses.

O futebol africano enfrenta grandes dificuldades estruturais, mas o continente é um autêntico alfobre de valores que encantam as ligas europeias com o seu futebol e são vítimas de racismo. As academias locais descobrem e trabalham os talentos que depois lançam nos relvados internacionais. Em Portugal, quantos são? «São muitos» foi a resposta que consegui da Federação depois de quatro mensagens de correio electrónico e uma visita.

Joseph Blatter, o patrão da FIFA, a autoridade que governa o futebol mundial, assinou um acordo com a CAF antes da final da taça para desenvolver o futebol africano através da formação de treinadores e árbitros, do futebol juvenil e da medicina desportiva – e talvez para assegurar o quinto mandato à frente da FIFA.

Uma nota final: a ideia da Confederação Africana de Futebol nasceu em Lisboa em Junho de 1956 durante um congresso da FIFA. Um ano depois, Egipto, Sudão, Etiópia e África do Sul fundaram a CAF. Hoje a associação conta com 56 membros e está sediada no Egipto.

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