30 de outubro de 2010

RETORNO


Milhares de sulistas iniciaram a viagem de regresso às terras de origem em preparação para o referendo sobre a auto-determinação do sul do Sudão.
O referendo em que os sulistas vão escolher entre a independência e a unidade com o Norte mantendo alguma autonomia devia ser feito até 9 de Janeiro de 2011.
Cerca de 10 mil pessoas partiram de Cartum num comboio de 90 autocarros e 38 camiões e devem chegar ao Sul dentro de dez dias. Os mais abastados viajaram de avião.
Espera-se que até ao fim do recenseamento para o referendo a 1 de Dezembro umas 500 mil pessoas retornem ao sul.
O regresso de tantos retornados depois de muitos anos de refúgio no norte do Sudão devido à guerra civil de duas décadas pode trazer alguma tenção à região devido à falta de infra-estrutura.
O êxodo acontece depois de o Governo ameaçar os sulistas a viver no norte de tempos difíceis caso o sul declare a independência como aliás se espera.
O grande pomo da discórdia é o petróleo que jorra das entranhas do sul do Sudão: qualquer coisa como uns 400 mil barris por dia, cerca de 80 por cento da produção diária do país.
Há também que decidir quem vai pagar a dívida externa no evento da separação (estimada em mais de 32 mil milhões de dólares), como vão partilhar as águas do Nilo Branco e resolver a marcação das fronteiras em cerca de 20 por cento e a dupla nacionalidade para sulistas no norte e nortenhos no sul.

24 de outubro de 2010

LOLOGO


Celebrei o Dia Mundial das Missões com a comunidade de Lologo, nas aforas de Juba.
Trata-se de uma comunidade nova e jovem, frequentada sobretudo por crianças e jovens, e assistida por um colega sudanês, o padre Hector Ayon.
Os mais pequenos participaram na missa debaixo de uma árvore. O resto estava na capela em construção. Trata-se de uma estrutura coberta a zinco, oferta de um general local.
Lologo é o local onde a maioria dos 30 mil ilegais de Juba acabaram por se fixar depois das suas casas serem derrubadas.
A missa foi em Bari (a língua local), árabe de Juba e inglês.
Senti-me bem acolhido e desfrutei daquela mais de hora e meia de oração e louvor junto ao rio, a contemplar aquelas caras lindas, jovens, compenetradas, às vezes também irrequietas, mas uma velhota com chibata repunha a ordem litúrgica.
Um colega comentou que os miúdos devem cair das árvores ou do céu porque pais e mães não se viam por ali.
Mas a igreja cresce e acolhe os pequeninos, os marginalizados, que continuam a ser as filhas e filhos predilectos, o objecto e sobretudo o sujeito da sua missão.

20 de outubro de 2010

HOMOFOBIA


O jornal ugandês Rolling Stone publicou uma lista com os nomes dos 100 mais homossexuais do país, e as respectivas fotos e moradas.
A lista era acompanhada da legenda «Enforquem-nos!»Nos dias seguintes à publicação pelo menos quatro homens que constavam da lista foram atacados e outro viu a casa apedrejada por vizinhos.
Outros esconderam-se temendo retaliações.
No ano passado, um membro do parlamento ugandês tentou passar uma lei que punia a homossexualidade com a pena de morte ou prisão conforme os casos.
O promotor da lei homófoba contava com o apoio de evangelistas americanos, mas o projecto de lei foi abandonado por indicação do presidente Yoweri Museveni devido à forte reacção adversa internacional.
O Rolling Stone dizia que uma doença desconhecida e mortal estava a atacar a comunidade homossexual no Uganda e acusava-a de recrutar um milhão de crianças através de raides às escolas.
O director do jornal, Giles Muhame, disse que a publicação da lista era de interesse público.
O Rolling Stone ugandês começou a publicação em Agosto e tem uma tiragem de cerca de dois mil exemplares.
O jornal foi confiscado pelas autoridades não pelo conteúdo mas porque não estava registado.

16 de outubro de 2010

RESGATE

ALIMENTAÇÃO

O Sul do Sudão tem cerca de 8,5 milhões de habitantes mas 4,7 milhões estão expostos à fome e 1,7 milhões dependa de assistência alimentar para sobreviverem.
Segundo a FAO, em 2009 os agricultores do Sul do Sudão produziram 660 mil toneladas de alimentos, mas os habitantes precisam de 850 mil toneladas para sobreviver. As 225 mil toneladas em falta vêm de organismos internacionais de assistênia.Entretanto, a FAO apresentou hoje um plano de acção de dois anos para o sul do Sudão.A organização para a agricultura e alimentação da ONU diz que precisa de quase 68 milhões de dólares americanos para assistir cerca de dois milhões de sulistas na autonomia alimentar.Os responsáveis da FAO no sul do Sudão dizem que as mudanças climáticas são responsáveis pelo défice alimentar na região. Secas e inundações aliadas a alguma insegurança estão na origem da falta de comida na região.Hoje a ONU celebrou o Dia Mundial da Alimentação sob o tema «Unidos contra a Fome.»

12 de outubro de 2010

PRÉMIO


Uma jornalista da Cadeia Católica de Rádios do Sudão recebeu o Prémio UNICEF 2010 por um trabalho que publicou sobre os direitos da criança.
Marvis Birungi recebeu o prémio da melhor história da imprensa escrita do Sul do Sudão com o trabalho «Meninos de Rua: Responsabilidade de Quem», publicado no semanário The Juba Post.
A reportagem fala sobre as condições que levam as crianças a viver na rua e os riscos a que se expõem.
Marvis disse que é uma honra receber o prémio que lhe vai a possibilidade de viajar até ao Cairo, no Egipto.
A melhor reportagem da rádio foi para uma jornalista da Miraya FM, uma estação da ONU, que trouxe à antena o drama de uma criança presa em Juba. A criança foi libertada em consequência da reportagem.
A UNICEF premiou ainda quatro jornalistas do Norte do Sudão com três reportagens e uma foto-reportagem publicadas em jornais de Cartum.

11 de outubro de 2010

ATENTADO



O arcebispo de Cartum escapou ileso a um atentado enquanto celebrava a missa dominical.
O indivíduo da tribo Misseriya, identicado como Hamdan Mohamed Abdurrahman, tentou assassinar o cardeal Gabriel Zubeir Waqo enquanto este celebrava uma missa campal em honra de São Daniel Comboni, o fundador da Igreja Católica no Sudão.
O cerimoniário e guarda-costas do cardeal, Barnaba Matuec Anei, disse que depois do Glória enquanto os bailarinos regressavam aos seus lugares, viu um homem dirigir-se para o altar empunhando uma arma branca.
O mestre-de-cerimónias correu para o atacante, tirou-lhe o punhal e neutralizou-o, entregando-o depois aos polícias que faziam a segurança da missa.
Matuec disse que o atacante repetia «Não há problema» quando ele o travou.
O agressor encontra-se detido pela polícia para averiguações.
O atentado decorreu um dia depois de pró-unionista e pró-independentistas terem chocado durante um rali organizado pelo governo para promover a unidade do Sudão.

4 de outubro de 2010

DE VOLTA

Estou de volta a Juba e de volta ao Jirenna! As férias passaram a correr e a viagem de regresso foi óptima apesar de levar 24 horas entre voos e esperas. Um senão: tive que deixar em Lisboa duas garrafas de vinho verde e um boião de mel por excesso de peso. Mas trouxe o bacalhau! E um funcionário do café do aeroporto vai beber o vinho por mim.
Aqui fica um bem-haja do tamanho do mundo para os meus familiares, amigos e colegas que durante os últimos três meses encarnaram o cuidado, a ternura e o amor de Deus por mim. Jesus diz que para o seguirmos temos que deixar muito mas depois recebemos 100 vezes mais. E é verdade: as férias foram uma demonstração inequívoca de que Ele é um cavalheiro e não falta à palavra dada.
Encontrei os meus colegas missionários e missionárias todos bem. Houve alguns melhoramentos nos quartos destinados aos hóspedes e na cozinha – a casa está muito mais convidativa e arrumada – e agora temos galinhas e perus!
Os pés de manga estão floridos e prometem uma boa colheita lá para Dezembro. As papaieiras também estão bonitas e as goiabas bem gostosas.
Um senão: encontrei um jornalista que trabalha comigo muito maltratado. O presidente do Sul do Sudão, Salva Kiir Mayardit, regressou na sexta-feira de uma visita aos Estados Unidos. O governo organizou uma manifestação de boas-vindas no aeroporto e o Memo Lasuba estava a cobrir o acontecimento para a Rede Católica de Rádios do Sudão. Não se sabe por que carga de água a segurança o individualizou. O jornalista identificou-se mas depois foi brutalmente espancado por um soldado e dois polícias. Esta tarde vou apresentar queixa ao ministro da segurança interna.
De resto, Juba continua um autêntico estaleiro com tantos edifícios em construção apesar das incertezas do referendo sobre a auto-determinação que vai decorrer a 9 de Janeiro.
Por falar em referendo, o recenseamento de eleitores foi adiado para Novembro e já devia estar pronto a 9 de Julho. O norte e o sul continuam a trocar picardias sobre a consulta popular e o dia a chegar sem nada estar preparado. Será que o Sul vai fazer uma Declaração Unilateral de Independência? O secretário-geral do SPLM, o partido que governa o sul, disse-me uma vez que era uma alternativa ao referendo.