11 de fevereiro de 2009

PALAVRAS


E Demétria, num murmúrio de voz, s mãos procurando na terra húmida as bagas e as ervas de todos os poderes, engrenava numa cantilena que não acabava mais, que metia castelos e fontes e barcas antigas, luas e tigres, raízes que escondiam as dores do mundo, encruzilhadas e pontes de nomes estranhos, até que a sua voz acabava por se confundir com o som da brisa nas folhas dos choupos e dos salgueiros. Piedade gostava de a ouvir, deixava-se embalar pela magia das palavras e, quando chegava a casa, apesar de cansada e a cair de sono, ainda tomava nota de algumas nos seus cadernos. Piedade gostava de palavras como se gosta de pessoas. E tinha a certeza que era nelas, e não nas bagas, nas raízes, nas sementes ou nas ervas, que estava a salvação do mundo. Mas nunca o disse a Demétria, não queria dar-lhe esse desgosto.

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