29 de abril de 2007

Pitão


Forte de Jesus

© JVieira

OS GRAFITOS DA SAUDADE

Os Portugueses construíram o Forte de Jesus em 1593 para controlar a entrada do porto da cidade-ilha de Mombaça e as rotas comerciais do Oceano Índico. Em 1698, depois de mais de dois anos de cerco, a fortaleza foi tomada pelos árabes.
Uma das atracções do Forte de Jesus são os grafitos que os marinheiros portugueses pintaram em duas paredes de uma caserna. Naquele tempo não havia latas de spay. Por isso, tiveram que se contentar com carvão e ocre.
Os desenhos «falam» do mar e da saudade. Mombaça ficava a seis meses de viagem de Lisboa. Um coração atrai a vista dos visitantes: suspiro por um amor distante. Uma mulher acena adeus das arcadas de um palácio. Há igrejas, um cruzeiro, um castelo. Um português raçudo desafia sete inimigos árabes chineses. E muitos navios: barcos, caravelas, naus, galeões. Há ainda dois peixes e um bicharoco que se parece com um camaleão.
Os desenhos foram restaurados em 1967 através de uma ajuda da Fundação Gulbenkian.

26 de abril de 2007

FC Porto global

Forte de Jesus - Mombaça Jovem queniano veste camisola do FCP © JVieira

Uganda

CONVERSAÇÕES DE PAZ

As conversações de paz entre o governo ugandês e o Exército de Resistência do Senhor (LRA em inglês) foram retomadas hoje em Juba sob a mediação de Joaquim Chiçano, ex-presidente de Moçambique e enviado especial da ONU para o Norte do Uganda e o Governo do Sul do Sudão.
O LRA sentou-se à mesa das negociações em Julho passado. As conversações foram interrompidas em Dezembro. Os rebeldes ugandeses alegaram razões de segurança e falta de confiança no mediador, Riek Machar, o vice-presidente do Sul do Sudão.
As conversações de paz são seguidas pela sociedade civil e religiosa ugandesa, por representantes de cinco países africanos e por enviados da Pax Christi e da African Peace Point.
Joseph Kony, o lídel do LRA encontra-se no seu refúgio na floresta da RD Congo. Os rebeldes intervêm no norte do Uganda e no Sul do Sudão e fizeram milhares de mortos em 21 anos de confrontos, além de empregarem crianças-soldados e obrigarem as meninas a serem escravas sexuais dos seus líderes.

Dias de paraíso




Mombaça © JVieira
Trago nos olhos o verde do mar, o azul do céu, os lagartos e as flores de todas as cores;
Trago nos ouvidos o falar do mar, o chilrear dos pássaros, o silêncio da noite de luar, o bailar dos coqueiros agitados pelo vento;
Trago no corpo o sabor a sal, o bronze do sol, a carícia cálida da noite e da água quente do Índico; Trago na boca o sabor doce de comidas temperadas com especiarias, a água fresca do coco, a textura da sua polpa doce;
Trago a memória de batalhas sem fim no Forte de Jesus, a saudade escrita com grafitos desenhados a carvão na parede da caserna, o desmoronamento de um império maior que si mesmo;
Trago no coração as conversas de praia com jovens sem grande futuro, que ganham umas moedas a vender porta-chaves de pau-preto, a trazer cerveja, meninas, rapazes, entretenimento para «muzungos» carentes e com dinheiro; o sorriso inocente das crianças; os olhos vivos de mulheres literalmente tapadas dos pés à cabeça;
Trago na alma o celebrar alegre de comunidades cristãs que festejam o Senhor da Vida;
Trago o agradecimento pelos dias de descanso, de lazer e de prazer, sentado junto ao mar a contemplar, a ler, a escrever, a nadar, a caminhar, a viver!

12 de abril de 2007

Até já

Mãe e filha (Amel) dinkas © JVieira

Durante uns dias estou no Quénia. Prometo voltar a postar logo que me seja possível. Abraço!

11 de abril de 2007

Mbeki visita Juba

Mbeki recebe insígnias sudanesas © JVieira

Thabo Mbeki completou uma visita de dias ao Sudão com uma breve passagem por Juba.
Em Cartum, o presidente da África do Sul pressionou o seu homólogo sudanês a aceitar uma força híbrida de paz para o martirizado Darfur.
As Nações Unidas querem enviar para o Oeste do Sudão 22 mil soldados da ONU e da União Africana, mas o Governo de Cartum continua a dizer que os 8 mil soldados mal equipados e mal treinados da União Africana chegam para pacificar um território do tamanho da França.
Mais de 200 mil pessoas morreram desde que os rebeldes do Darfur pegaram em armas contra o Governo em 2003 acusando Cartum de descriminar os agricultores não árabes do oeste do país.
O conflito deslocou mais de 2,5 milhões de pessoas e alastrou-se ao vizinho Chade.
Organismos internacionais de ajuda a operar no Darfur acusam as tropas sudanesas de usar a violação como arma de guerra contra as mulheres.
O presidente Mbeki chegou a Juba às 10 da manhã e foi recebido pelo presidente do Sul do Sudão, General Salva Kiir, no aeroporto internacional da cidade.
Depois da revista à guarda de honra e dos cumprimentos de boas-vindas, a caravana presidencial dirigiu-se para o Mausoléu de John Garangue, fundador do SPLA. Seguiu-se um breve encontro no salão do Conselho de Ministros.
O presidente Mbeki disse que veio a Juba para acompanhar o desenvolvimento do Sul do Sudão e verificar a implementação do Acordo Global de Paz.
Depois de um almoço rápido, o presidente da África do Sul voou para Paris por volta das 13h00.
A visita-relâmpago de Thabo Mbeki a Juba deixou muitos cidadãos descontentes. O serviço de propaganda do SPLM convocou os cidadãos para saudarem o presidente da África do Sul ao longo do percurso do aeroporto até à cidade.
A população respondeu em força, mas a caravana usou uma artéria nova em vias de conclusão que liga o aeroporto directamente aos ministérios enquanto que as pessoas se juntaram ao longo do percurso antigo.
A chuva intensa da noite limpou a terra que enchia os buracos do asfalto e a viagem seria incómoda para o ilustre visitante.
Os jubanos já estamos habituados a negociar as crateras que o tempo e a falta de manutenção escavaram na única artéria asfaltada da cidade.

10 de abril de 2007

Regresso às aulas

Alunos da St. Joseph Catholic Elementary School © JVieira

Os alunos do ensino básico do Sul do Sudão iniciaram hoje o novo ano lectivo depois de três meses de férias. As ruas e os recreios das escolas voltaram a encher-se de crianças com uniformes ainda impecáveis.
Pelas contas da UNICEF, 850 mil alunos estão matriculados no ensino básico do sul do Sudão. Trinta e quatro por cento são meninas. Dois recordes absolutos comparados com os 343 mil estudantes que frequentavam a escola primária durante os anos da guerra civil, quase todos rapazes, entre 1984 e 2005.
O novo ano lectivo traz novos desafios. A mudança de programas é um. Até ao ano passado, o árabe era a língua usada no ensino em todo o Sudão. A partir de agora, os professores do Sul do país passam a leccionar em inglês e nem todos estão suficientemente familiarizados com a língua de Shakespeare. Sobretudo os dos condados de Juba e de Terekeka, dois bastiões árabes durante os anos de conflito.
O outro desafio tem a ver com o orçamento para a educação. Apesar de o número de matrículas aumentar – e a UNICEF prevê que no fim do ano haja 1,6 milhões de estudantes nas escolas de ensino básico no sul do país – o dinheiro reservado para a educação baixou de 134 milhões em 2006 para 108 milhões de dólares em 2007, uma perda de 26 milhões de dólares. O exército recebeu mais de 500 milhões de dólares para gastar durante o corrente ano.
O analfabetismo é o inimigo número um do Sul do Sudão. Mais de 80 por cento da população são sabe ler nem escrever. Noventa por cento dos soldados do SPLA, o Exército de Libertação do Povo do Sudão, fazem parte desse grupo. Mas o Governo continua a apostar na defesa e … no partido. O SPLA também é SPLM (Movimento de Libertação do Povo do Sudão).

Vice-Presidente trava suicídio

Dr. Riek Machar, vice-presidente do governo do Sul do Sudão impediu uma ameaça de suicídio na manhã de ontem.
Um jovem desempregado escalou uma das antenas de transmissão da Southern Sudan Radio e ameaçou suicidar-se em protesto pela falta de trabalho.
Instigado pelos transeuntes a desistir da ideia e a descer, disse que só o faria se primeiro falasse com o presidente ou o vice-presidente do governo do Sul do Sudão.
O Dr. Machar dirigiu-se às antenas da rádio, na May Avenue, a espinha dorsal de Juba.
Através do megafone de um carro-patrulha pediu ao jovem que descesse a troco de uma promessa de emprego.
O jovem desceu da antena e o vice-presidente levou-o para o seu gabinete pondo termo à ameaça de suicido.
O desemprego é um dos grandes problemas de Juba. A vida na cidade é muito cara e nem toda a gente consegue trabalho devidamente remunerado.

9 de abril de 2007

Abrir aspas

A FELICIDADE EXIGE VALENTIA

Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes mas, não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo, e posso evitar que ela vá à falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise. Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.

Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um "não". É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo...

Fernando Pessoa
Obrigado, Leopoldo

8 de abril de 2007

Vi o Senhor

© JVieira


Do Evangelho segundo São João (20, 1-18)
No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao túmulo logo de manhã, ainda escuro, e viu retirada a pedra que o tapava.
Correndo, foi ter com Simão Pedro e com o outro discípulo, o que Jesus amava, e disse-lhes: «O Senhor foi levado do túmulo e não sabemos onde o puseram.» Pedro saiu com o outro discípulo e foram ao túmulo. Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo correu mais do que Pedro e chegou primeiro ao túmulo. Inclinou-se para observar e reparou que os panos de linho estavam espalmados no chão, mas não entrou. Entretanto, chegou também Simão Pedro, que o seguira. Entrou no túmulo e ficou admirado ao ver os panos de linho espalmados no chão, ao passo que o lenço que tivera em volta da cabeça não estava espalmado no chão juntamente com os panos de linho, mas de outro modo, enrolado noutra posição. Então, entrou também o outro discípulo, o que tinha chegado primeiro ao túmulo. Viu e começou a crer, pois ainda não tinham entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos. A seguir, os discípulos regressaram a casa.
Maria estava junto ao túmulo, da parte de fora, a chorar. Sem parar de chorar, debruçou-se para dentro do túmulo,
e contemplou dois anjos vestidos de branco, sentados onde tinha estado o corpo de Jesus, um à cabeceira e o outro aos pés. Perguntaram-lhe: «Mulher, porque choras?» E ela respondeu: «Porque levaram o meu Senhor e não sei onde o puseram.» Dito isto, voltou-se para trás e viu Jesus, de pé, mas não se dava conta que era Ele. E Jesus disse-lhe: «Mulher, porque choras? Quem procuras?» Ela, pensando que era o encarregado do horto, disse-lhe: «Senhor, se foste tu que o tiraste, diz-me onde o puseste, que eu vou buscá-lo.» Disse-lhe Jesus: «Maria!» Ela, aproximando-se, exclamou em hebraico: «Rabbuni!» - que quer dizer: «Mestre!» Jesus disse-lhe: «Não me detenhas, pois ainda não subi para o Pai; mas vai ter com os meus irmãos e diz-lhes: ‘Subo para o meu Pai, que é vosso Pai, para o meu Deus, que é vosso Deus.’» Maria Madalena foi e anunciou aos discípulos: «Vi o Senhor!» E contou o que Ele lhe tinha dito.

7 de abril de 2007

Páscoa Feliz

© JVieira

O pê de Páscoa é também o pê de Paz. Que a passagem do Ressuscitado na tua vida te encha da sua paz, da sua plenitude.

O ENCANTO DO CRUCIFICADO

O Darfur é uma província de morte no Oeste do Sudão. Mas também é lugar para um diálogo inter-religioso baseado no respeito mútuo como conta um missionário que lá vive.

«Eina! Olha quantas cruzes! E que bem alinhadas que estão ao longo de toda a igreja», exclamou Khalid, um aluno muçulmano durante uma visita de estudo à igreja paroquial de Nyala, no Sul do Darfur, surpreendido com a distribuição da via-sacra na parede da igreja.
Não havia cristãos entre os alunos. O que não me surpreende. A maioria dos católicos são desalojados e não têm dinheiro sequer para frequentar uma escola do estado quanto mais uma privada!
“Hoje trouxemos 195 alunos. A outra metade vem amanhã” – diz-me um dos professores. A visita honra o estabelecimento escolar e, ao mesmo tempo, é uma prova concreta de diálogo inter-religioso entre muçulmanos e cristãos.
O Gabriel – o catequista-chefe da paróquia – fez, no adro, uma apresentação geral da Biblia e da Igreja Católica. Depois os professores dividiram os alunos em quatro grupos para um encontro com o padre Emanuel Denima Darama dentro da igreja. É um comboniano congolês.
O padre Denima continuou a explicar as ideias principais do cristianismo. Os estudantes não o poupavam com perguntas. Um deles acabou por receber um raspanete do responsável: «Khalid, não me queiras deixar envergonhado neste lugar sagrado. Por favor, os comentários estúpidos são dispensados, e só se faz uma pergunta de cada vez.»
«Professor, não se preocupe; este aluno não está a ser malcriado; pelo contrário, está a pôr uma questão que toca o centro da fé cristã», atalhei.
O jovem, mais à vontade, exprimiu aquilo que lhe ia na alma: «Nós sabemos que a cruz é coisa de cristãos. Nunca duvidei da minha fé islâmica. Como muçulmano, sei que Jesus – Issa aleihi elsalam, a paz esteja com ele – não foi crucificado mas arrebatado directamente para o Paraíso. No entanto, neste momento acho-me confuso. O crucifixo que vejo à minha frente e em tamanho natural, faz-me muita impressão.»
A assembleia ficou em profundo silêncio, apreensiva. Talvez alguém quisesse comentar a opinião do colega. Mas ele, logo a seguir, arrematou: «Tenho ainda uma pergunta de curioso: aquela mesa ali, tão cuidadosa e lindamente coberta, para que serve, neste lugar sagrado?»
Enquanto Khalid falava, os pensamentos atravessavam a minha mente como relâmpagos. Seria este um dos momentos do «encanto» do Crucificado que, por vezes, sentimos através do seu Espírito?
Khalid não perguntou porque é que aquele homem se deixou pregar numa cruz. Eu tão pouco saberia responder-lhe. De facto, não tem mesmo explicação humana. Faz parte do insondável mistério de Deus que veio ter connosco, «rebaixando-se até à morte e morte de cruz». Coisa de que só o amor de Deus é capaz.
Mas a morte de Jesus é uma morte que gera Vida. Não será, talvez, de forma automática. Será mais uma caminhada lenta e provada. A Bíblia fala-nos da tolerância e da paciência de Deus, tema apreciado também pelo Islão. Um dos 99 atributos ou mais belos nomes de Deus escritos no Alcorão é precisamente «El Sabur», infinitamente paciente. Ninguém é excluído da Salvação oferecida por meio de Jesus Cristo crucificado. Mas não é próprio de Deus queimar etapas. O seu estilo preferido é não forçar o ritmo das suas criaturas. A seu tempo tudo acontecerá. Eu acredito nesse milagre.
Delicadamente ousei interromper o silêncio dos alunos que, acredito, era espaço habitado pelo Espírito Santo.
«Desculpem, permitam-me só uma observação a Khalid. O Issa que lês no Alcorão, chama-se Jesus no Evangelho. E agora vamos à pergunta curiosa sobre o que faz aquela mesa neste lugar sagrado.
«Aquela mesa é o lugar onde acontece a Morte e a Vida. À volta dela reunimo-nos para a refeição sagrada. Vós, no Islão, celebrais a festa do “Adha”, o sacrifício, na qual comeis a carne do cordeiro cujo sangue tem que ser derramado. E quando uma pessoa é morta violentamente vós usais a palavra “zabaha”, não é verdade? Essa palavra indica que o sangue escorreu até à última gota, certo? Se não for verdade, estejam à vontade e não tenham receio de me corrigir.
«Para nós, cristãos, Jesus substitui o cordeiro na Páscoa dos hebreus do Antigo Testamento. É Ele o Cordeiro da Páscoa cristã. Talvez, aos ouvidos dos muçulmanos estas palavras soam como blasfémia. Mas não vejo nenhum de vós tapar os ouvidos, que tomo como sinal de apreço e respeito. Obrigado!
«Na vossa bela língua árabe, esta mesa tem o nome de “mazbah”. Sabem sem dúvida do que trata. Sim, os cochichos ai no fundo da igreja, queremos ouvi-los. Ora venham lá essas achegas em voz alta!»
«Dá a ideia de matadouro ou matança. Lugar do sacrifício. Holocausto. Sabe a sangue», alguns alunos foram comentando.
«Obrigado. Aconteceu há dois mil anos: Jesus morreu no alto da cruz e ao terceiro dia ressuscitou. O altar – “mazbah” – representa o sacrifício, a oferta de Jesus e está intimamente ligado com este acontecimento e faz parte da mesma realidade. Sobre esta mesa faz-se a celebração da maior festa do cristianismo: a Páscoa, dia da Ressurreição de Jesus, que se repete cada domingo.
«Jesus oferece-se como “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”. É o banquete da Páscoa que somos convidados a partilhar em refeição de comunhão. É a festa da Eucaristia, isto é, acção de graças pelas maravilhas que Deus fez e continua a fazer através da Morte e Ressurreição daquele Jesus que contemplamos ao olhar o Crucifixo.
«A expressão dos vossos olhos diz-me que não estais a acompanhar o meu pensamento. Mas não vos censuro por isso. Quem se atreveria? A lógica e a filosofia ajudam a chegar à fé. Mas neste caso concreto elas valem-nos de bem pouco. Aqui somos convidados a entrar no mistério da fé, cujo segredo reside em Deus. Ele criou-nos livres e deu a cada um a chave do próprio coração. É uma fechadura que só podemos abrir por dentro. Se deixarmos Deus entrar, Ele partilhará connosco os seus segredos. Para Ele não há distinção de raças e não lhe importa que O tratemos por Deus, Theos, God ou Allah, em latim, grego, inglês ou, árabe. Ou que lhe falemos com a voz silenciosa do coração. Se O deixarmos entrar, Ele passará de hospede a Senhor da nossa vida. E ensinar-nos-á os caminhos da fé; por vezes tão diferentes e até contraditórios.
«Deus sabe tirar partido das más escolhas dos seres humanos, em favor da Vida que Ele reservou desde sempre para as suas criaturas. Todas, a seu tempo e sem queimar etapas.»
Ao despedir-me de Khalid, disse-lhe a sós: «Não fiques a cismar na crucifixão. Deixa-te encantar pelo Crucificado! Para aqueles que O contemplam com olhos de fé, a sua morte gera Vida. Não é uma vida passageira e mesquinha mas de valor divino, como a d‘Ele. Condiz perfeitamente com o teu lindo nome, Khalid, eterno e glorioso.»


Feliz da Costa Martins
missionário comboniano
Nyala (Darfur – Sudão)

3 de abril de 2007

Lixo

O lixo que suja as ruas de Juba e põe em risco a saúde pública, continua a ser tratado como questão de estado e voltou a entrar na agenda do Conselho de Ministros.
O ministro da Informação disse no final do Conselho de Ministros que não era claro a quem competia limpar Juba da porcaria que se acumula juntos aos mercados, áreas residenciais e hotéis.
O Ministro Samson L Kwaje rematou que «Juba é a cidade mais suja do mundo.»
Juba encontra-se debaixo de três autoridades distintas de que é capital: condado, Estado de Central Equatoria e Governo do Sul do Sudão.

O executivo decidiu passar a bola ao Comissário de Juba, que opera sob as ordens do Governador do Estado de Central Equatoria.
O Governador, entretanto, decidiu privatizar a recolha e tratamento de lixo.
Será desta que Juba vai ter a cara lavada?

As chuvas aproximam-se e a cólera pode atacar de novo se entretanto a cidade não for limpa.

2 de abril de 2007

Refracções

© JVieira

Fico aqui
bebendo as tuas palavras,
sorrindo para elas
e elas para mim,
vejo nelas a vida
que brota
e deixo-me envolver
nessa Vida!
Olho o mundo através
do doce olhar,
que pões em cada palavra,
pressinto em cada uma,
o teu amor
a esse mundo,
e fazes dele a tua casa,
as tuas roupas são as pessoas
com que te cruzas,
e vais colorindo o mundo,
com as cores do teu coração,
que irradiam alegria, vida e amor!
Vejo as tuas mãos vazias,
mas o coração cheio,
aí tens o teu tesouro,
que vais dando,
e vais enchendo outros corações,
pela tua casa fora,
porque a tua casa é o mundo!
elsa sekeira
Shukran, Sabitayi

1 de abril de 2007

Mangas da discórdia

© JVieira

Kworijik Luri é uma pequena aldeia a uma dúzia de quilómetros atrás do aeroporto internacional de Juba.
Fica numa imensa planície com o horizonte a perder-se de vista.
Está relativamente perto de Juba, mas o clima é mais agradável e a vegetação muito diferente.
De entre as muitas espécies vegetais presentes na planura de Kworijik sobressaem as mangueiras: árvores enormes, imponentes, frondosas, carregadas de mangas maduras e saborosas. A primeira colheita deste ano. A segunda virá antes do Natal!
As árvores pertencem aos habitantes daquela zona, o povo Bari. Entretanto os Mundari – pastores nómadas – chegaram com as suas vacas e alimentam o gado com as mangas que não lhes pertencem.
Peter Moga Kenyi, um ancião, queixou-se, sentado debaixo de uma mangueira, que o que os Mundari fazem não está correcto: «Além de darem as mangas às vacas, batem nas nossas crianças.»
«Mas os Mundari têm armas e nós temos paus», concluiu resignado. E pediu que as autoridades interviessem para pôr termo à guerra das mangas.
As lutas intertribais pela posse da terra ou para roubar gado são uma fonte preocupante de insegurança no Sul do Sudão. O Governo tem em curso um programa de desarmamento da sociedade civil, mas é difícil convencer os detentores de armas a entregá-la pacificamente. E os que o fazem ficam em desvantagem em relação aos que ainda não desarmaram. Como os Bari em relação aos Mundari.